Da banalidade à repressão: uma análise estilística de “Cotidiano”, de Chico Buarque

Resumo

Este trabalho busca oferecer uma análise estilístico-discursiva da letra da canção “Cotidiano”, de Chico Buarque, observando os efeitos de sentido causados pela repetição. Propõe-se analisar a letra da canção, presente no álbum Construção (1971), segundo a Estilística do Discurso (HENRIQUES, 2011) e com o auxílio de formulações teóricas e de trabalhos da Semiótica Discursiva (FIORIN, 1996), a fim de considerar não apenas os recursos estilísticos textuais e a imbricação das camadas discursivas na construção de sentido, mas também o contexto de produção e o meio no qual a canção está inserida. A partir de Henriques (2011), analisa-se a letra da canção ao longo deste artigo observando as diversas camadas da linguagem verbal orquestradas no gênero em questão, depreendendo a expressividade de cada camada e sua relação com o conteúdo à medida em que se torna relevante para a argumentação. Por meio deste percurso, demonstra-se como a repetição de diversos recursos expressivos, a coesão semântica responsável por formar diferentes isotopias e o contexto de lançamento da obra são responsáveis por construir a ambiguidade do texto por meio da repetição. Conclui-se então que a letra da canção transita entre a banalidade do dia a dia de um casal e a repressão da Ditadura Militar por meio da atualização de sentido do próprio texto, construindo assim, também, uma crítica social ao regime.