O sexismo em acepções pejorativas em dicionários de português brasileiro

Cezar Alexandre Neri Santos, Janina Antonioli Pires, Adelmileise de Oliveira Santos

Resumo


Motivados por um debate coletivo, em outubro de 2019, quanto à dicionarização de um sentido vulgar para o lexema professora, decidiu-se refletir como os dicionários, enquanto suportes linguísticos, estabelecem semântico-discursivamente questões de gênero em português brasileiro. Assim, este trabalho descreve e analisa (não) ocorrências de acepções relacionadas à violência de gênero em dicionários de língua portuguesa para brasileiros. Para isso, tomamos o texto-anedota Injustiças da Língua Portuguesa, de autoria anônima e amplamente divulgado pela internet, que estabelece humoristicamente diferenças semânticas para sintagmas nominais como puto/puta, cachorro/cadela, o/a galinha, entre outros. Por meio de consulta lexicográfica, buscamos registros em diferentes dicionários, a saber: Ferreira (2009), Houaiss (2009), Aulete Digital (2007) e Informal (2014), os quais geraram uma codificação e permitiram um debate sobre sexismo e violência linguística. Como principal resultado, constatamos que parte considerável dos dicionários, tanto on-line quanto impressos, ratifica o perjúrio ao gênero feminino ao registrar acepções pejorativas, ao passo que, nas formas nominais do gênero masculino, costuma-se apresentar a acepção registrada na anedota, neutralizando aspectos pejorativos à masculinidade ou não atribuindo relação com sua sexualidade.


Palavras-chave


Lexicografia Discursiva. Sexismo. Violência linguística.

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DOI: http://dx.doi.org/10.22168/2237-6321-10esp2119

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